Do lado certo da História

24 Setembro 2025

por João Godinho Martins

A 80ª Assembleia Geral das Nações Unidas será uma das mais importantes de sempre. Estamos num momento-chave. Um momento que exige uma posição determinada e visionária. Queremos um Portugal que nos orgulhe, que não hesite em assumir um papel de liderança, que mostre coragem, responsabilidade e ambição nas grandes causas globais. É tempo de deixar de marcar posição e de contribuir ativamente para o bem comum.

Portugal tem de empenhar-se com determinação na promoção dos direitos humanos com ações tangíveis e eficazes durante as sessões de trabalho da 80.ª sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU80). Esse empenho tem de ter uma tradução prática no compromisso total com o direito internacional humanitário, em especial nas situações em que os civis continuam a ser privados dos seus direitos e dignidade…

A Amnistia Internacional pede ao governo português que deixe claro, no seu discurso perante a Assembleia, que o genocídio de Israel contra os palestinianos em Gaza deve terminar imediatamente. O silêncio e a inércia já não são uma opção sem que tal signifique que o nosso país é cúmplice desse genocídio. A exigência de um cessar-fogo imediato e do levantamento incondicional do bloqueio ilegal de Israel à Faixa de Gaza deve ser clara e inequívoca. Portugal tem de assumir compromissos firmes no que diz respeito à urgência de todos os Estados cumprirem as suas obrigações internacionais. Urge cessar todas as transferências de armas e equipamento militar. E tem de se pôr fim a qualquer comércio ou transferências de bens que contribuam para ou estejam ligados ao genocídio de Israel, à sua ocupação ilegal do território palestiniano e ao seu sistema de apartheid.

“O silêncio e a inércia já não são uma opção sem que tal signifique que o nosso país é cúmplice desse genocídio. A exigência de um cessar-fogo imediato e do levantamento incondicional do bloqueio ilegal de Israel à Faixa de Gaza deve ser clara e inequívoca.”

João Godinho Martins

Em Gaza, mas também noutras partes do mundo, as instituições internacionais são cada vez mais desrespeitadas. Agora é mais importante do que nunca que os princípios e normas contidos na Declaração Universal dos Direitos Humanos e outras normas do direito internacional em matéria de direitos humanos se reflitam de forma progressiva nas deliberações e resultados da AGNU80, demonstrando um compromisso genuíno dos Estados-Membros da ONU em proteger os direitos de todos.

Neste contexto, desde a Amnistia Internacional pedimos ao governo português que defenda as vítimas e sobreviventes de violações dos direitos humanos e aqueles que trabalham incansavelmente para proteger esses direitos, apoiando iniciativas que visam combater essas violações e resistir às tentativas de minar a linguagem acordada, introduzir emendas hostis ou bloquear a discussão.

Encorajamos Portugal a falar abertamente sobre a difícil situação enfrentada pelos defensores dos direitos humanos e o papel essencial que desempenham, bem como o seu direito de trabalhar pela promoção e proteção dos direitos humanos sem perseguição, retaliação e medo. Além disso, encorajamos os nossos representantes a colaborar com outros para resolver o problema da redução do espaço de atuação da sociedade civil, tanto na ONU como em vários países do mundo, garantindo, por exemplo, que o acesso e a participação da sociedade civil nos assuntos da ONU sejam concedidos sem obstáculos ou restrições.

“Encorajamos Portugal a falar abertamente sobre a difícil situação enfrentada pelos defensores dos direitos humanos e o papel essencial que desempenham, bem como o seu direito de trabalhar pela promoção e proteção dos direitos humanos sem perseguição, retaliação e medo.”

João Godinho Martins

Portugal deve enviar uma mensagem clara sobre a importância do respeito, proteção e promoção dos direitos das mulheres e raparigas, incluindo a saúde e os direitos sexuais e reprodutivos. E defender os quadros normativos que sustentam a igualdade de género e repelir as tentativas de reverter compromissos internacionais de longa data com os direitos das mulheres e das raparigas.

A AGNU80 também terá a importante responsabilidade, juntamente com o Conselho de Segurança, de organizar o processo para selecionar e nomear o sucessor de António Guterres quando o seu mandato terminar a 31 de dezembro de 2026. A Amnistia Internacional defende que o processo de seleção e nomeação do novo secretário-geral da ONU seja transparente, inclusivo e justo e garanta que a sociedade civil tem oportunidades concretas e reais de participar, dar a sua opinião e interrogar os candidatos.

O ministro dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel, não pode ignorar estes temas.

Diretor-geral da Amnistia Internacional – Portugal. Artigo originalmente publicado no jornal Público, a 23 de setembro de 2025


Agir Agora