Seguir de forma rigorosa a dieta mediterrânica — que é tipicamente a portuguesa, espanhola, italiana e grega — reduziu em pelo menos 35% o risco de demência em pessoas com duas cópias do gene APOE4, um dos principais fatores genéticos associados à doença de Alzheimer, segundo um estudo recente.
A investigadora Yuxi Liu, autora principal do estudo, publicado no final do mês de agosto, explicou que foram acompanhadas mais de 5700 pessoas ao longo de 34 anos. As que seguiram de forma consistente uma dieta mediterrânica básica, com pouco álcool e baixo consumo de carnes vermelhas e processadas, mas rica em vegetais, frutas, frutos secos, cereais integrais, leguminosas, peixe e azeite, apresentaram uma redução significativa do risco de demência.
Investigadora no Brigham and Women’s Hospital e na Harvard Medical School, em Boston, Liu afirmou que os maiores benefícios foram observados nas pessoas com o gene APOE4, sobretudo naquelas que possuem duas cópias.
Além de reduzir em 35% a probabilidade de desenvolver demência nesse grupo, uma adesão ainda mais rigorosa à dieta diminuiu o risco de forma adicional.
Melhoria da função metabólica através da dieta
Outro resultado importante do estudo mostra que pessoas com o gene APOE4 parecem ter perfis metabólicos específicos que respondem de forma intensa aos nutrientes saudáveis da dieta mediterrânica.
Segundo Liu, os processos metabólicos, como a digestão de nutrientes, a produção de energia e a reparação de nervos e tecidos do corpo e do cérebro, dependem fortemente da qualidade das vitaminas, enzimas, aminoácidos, hidratos de carbono e lípidos fornecidos por uma alimentação saudável.
Na sua perspetiva, a melhoria da função metabólica através da dieta pode explicar — parcialmente, pelo menos — a grande redução no risco de demência observada. Contudo, conforme disse Liu, são necessários outros estudos para confirmar esta hipótese.
Para Richard Isaacson, neurologista e diretor de investigação no Institute for Neurodegenerative Diseases, na Florida, esta descoberta é algo que muda paradigmas.
Segundo ele, o estudo pode ajudar a combater a ideia de que ter duas cópias do gene APOE4 significa inevitavelmente desenvolver Alzheimer, afirmando que os genes não têm de ser um destino inevitável.
Se uma pessoa com o mais alto risco genético consegue reduzir em 35% o risco de demência apenas com uma dieta específica, é possível imaginar o impacto quando se combinam vários outros fatores, como exercício, sono, gestão do stress e outros comportamentos saudáveis.
Conflito com Trump pode colocar em risco várias décadas de estudos
O novo estudo acompanhou homens e mulheres entre os 55 e os 75 anos que faziam parte do Nurse’s Health Study, iniciado em 1976 para investigar os fatores nutricionais de risco para doenças crónicas em mulheres, e do Health Professionals Follow-Up Study, que acompanha a saúde e a alimentação de homens desde 1986.
Os dados alimentares e as amostras de ADN, sangue, urina, fezes e tecidos recolhidos por estas investigações permitiram avanços científicos importantes, como a descoberta dos perigos das gorduras trans, a ligação entre obesidade e cancro da mama, mesmo em adolescentes, e a relação entre o tabagismo e as doenças cardíacas.
Contudo, segundo a CNN, o financiamento federal para estes estudos foi interrompido devido a conflitos da administração Trump com a Universidade de Harvard.
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