30 Setembro 2025
- Grupos armados palestinianos devem libertar imediata e incondicionalmente todos os civis reféns na Faixa de Gaza ocupada
- Hamas e outros grupos armados palestinianos também devem devolver imediata e incondicionalmente todos os corpos sequestrados a 7 de outubro de 2023
- “Israel deve parar imediatamente o seu genocídio contra os palestinianos em Gaza, incluindo a sua política deliberada de fome e deslocação em massa” – Agnès Callamard
- Amnistia Internacional exige que Israel liberte imediatamente os milhares de palestinianos que detém arbitrariamente e cesse a sua prática ilegal de longa data de reter os corpos de palestinianos como moeda de troca
Os grupos armados palestinianos devem libertar imediata e incondicionalmente todos os civis mantidos como reféns na Faixa de Gaza ocupada, reiterou a Amnistia Internacional, quase dois anos após terem sido capturados durante os ataques liderados pelo Hamas no sul de Israel, a 7 de outubro de 2023.
A organização também reitera os seus apelos para um cessar-fogo imediato e para que Israel ponha fim ao genocídio em curso contra os palestinianos em Gaza. Ao longo do último mês, Israel intensificou a sua campanha de aniquilação contra os palestinianos em Gaza. O resultado foi um número cada vez maior de mortos e a destruição deliberada de infraestruturas civis, deslocando à força centenas de milhares de palestinianos, o que foi ilustrativo da determinação israelita em provocar a destruição física do povo palestiniano.
A atual escalada militar de Israel em Gaza, em particular na cidade de Gaza, não só está a ter consequências catastróficas para os palestinianos que lutam para sobreviver a uma fome provocada e à deslocação forçada, como também coloca ainda mais em risco a vida dos israelitas e de outras pessoas mantidas como reféns por grupos armados palestinianos. A 20 de setembro de 2025, as Brigadas Al-Qassam, ala militar do Hamas, publicaram o que descreveram como uma “imagem de despedida”, com fotografias de pessoas ainda mantidas como reféns, aumentando assim os receios sobre o seu destino.
Das 47 pessoas que continuam detidas ilegalmente, acredita-se que, aproximadamente 20, todas elas homens, ainda estejam vivas. Correm grave risco de morte, tortura e outros maus-tratos. São as últimas remanescentes das 251 pessoas – na sua maioria civis – que foram capturadas, na maioria dos casos vivas, e levadas para Gaza durante os brutais ataques liderados pelo Hamas, a 7 de outubro de 2023. A maioria foi levada viva, mas, em 36 casos, segundo relatos, os agressores palestinos apreenderam os corpos de pessoas que foram mortas durante os ataques. A tomada de reféns é uma grave violação do direito internacional humanitário e constitui um crime de guerra.
“Cada momento de inação custa mais vidas e aprofunda os horrores que os civis enfrentam. Um cessar-fogo imediato não é apenas um imperativo moral, é uma responsabilidade global. Israel deve parar imediatamente o seu genocídio contra os palestinianos em Gaza, incluindo a sua política deliberada de fome e deslocação em massa. Os grupos armados palestinianos devem libertar imediatamente todos os reféns civis”, afirmou Agnès Callamard, secretária-geral da Amnistia Internacional.
“Israel deve parar imediatamente o seu genocídio contra os palestinianos em Gaza, incluindo a sua política deliberada de fome e deslocação em massa. Os grupos armados palestinianos devem libertar imediatamente todos os reféns civis.”
Agnès Callamard
“Enquanto se aguarda a sua libertação, o Hamas deve garantir que todos os reféns sejam tratados com humanidade, tenham acesso a observadores internacionais e possam comunicar regularmente e com dignidade com as suas famílias e entes queridos. O Hamas e outros grupos armados palestinianos também devem devolver imediata e incondicionalmente os todos os corpos sequestrados a 7 de outubro de 2023. Qualquer coisa menos do que isso continua a constituir crimes graves ao abrigo do direito internacional e é mais uma fonte de angústia para as famílias desesperadas pelo regresso em segurança, ou pelo menos por notícias, dos seus entes queridos”.
As declarações e ações do Hamas e da Jihad Islâmica Palestiniana deixaram claro que têm mantido civis e soldados como moeda de troca para obrigar as autoridades israelitas a cessar os seus ataques militares, libertar todos os prisioneiros palestinianos detidos arbitrariamente e pôr fim ao bloqueio de Gaza e à sua ocupação ilegal do território palestiniano. Esta conduta corresponde à definição de tomada de reféns ao abrigo do direito internacional.
Desde outubro de 2023, as autoridades israelitas aumentaram drasticamente a detenção de palestinianos em todos os Territórios Palestinianos Ocupados (TPO). De acordo com a Hamoked – ONG israelita de defesa dos direitos humanos -, a 1 de setembro de 2025, 11 040 palestinianos estavam detidos pelas autoridades israelitas, alguns dos quais estão na prisão há décadas. Mais de metade – cerca de 57% – estão detidos sem acusação ou julgamento, seja sob detenção administrativa ou sob a Lei dos Combatentes Ilegais. De acordo com o Centro de Assistência Jurídica e Direitos Humanos de Jerusalém (JLAC), os corpos de, pelo menos, 730 palestinianos estão retidos por Israel como moeda de troca, alguns há décadas.
A Amnistia Internacional exige que Israel liberte imediatamente os milhares de palestinianos que detém arbitrariamente, ponha fim aos abusos contra os detidos, que incluem tortura, fome e violência sexual, e cesse a sua prática ilegal de longa data de reter os corpos de palestinianos como moeda de troca.
“Não pode haver justificação para sequestrar pessoas como reféns nem para a detenção arbitrária prolongada de indivíduos sem acusação ou julgamento. O mundo não deve virar as costas à humanidade”, afirmou Agnès Callamard.
Abuso físico, sexual e psicológico de reféns em cativeiro
Os israelitas e nacionais de outros países feitos reféns enfrentaram uma provação angustiante desde 7 de outubro de 2023. Todos os reféns foram mantidos incomunicáveis, negando-lhes qualquer contacto com a sua família ou acesso ao Comité Internacional da Cruz Vermelha (CICV) até ao momento da sua libertação. Muitas famílias não receberam sinais de vida que indicassem se os seus entes queridos estavam vivos ou mortos durante meses ou mais, agravando o seu sofrimento.
Em relatos que prestaram à Amnistia Internacional, aos meios de comunicação social ou a profissionais médicos, os reféns libertados relataram ter sido vítimas de abusos enquanto estavam em cativeiro. Um refém libertado disse à Amnistia Internacional que ele e outros quatro homens foram espancados durante vários dias após terem sido capturados e descreveu ter sido mantido num túnel e privado de comida e água adequadas.
Pelo menos cinco outros homens e uma mulher relataram publicamente que foram vítimas de espancamentos e outros maus-tratos físicos, e quatro mulheres, duas raparigas e dois homens relataram publicamente terem sido vítimas de agressão sexual, nudez forçada ou ameaças de casamento forçado. Estas são formas de violência física e sexual que constituem tortura ou outros maus-tratos ao abrigo do direito internacional.
Um refém libertado disse à Amnistia Internacional que ele e outros quatro homens foram espancados durante vários dias após terem sido capturados e descreveu ter sido mantido num túnel e privado de comida e água adequadas.
Um profissional médico envolvido no tratamento de reféns libertados em novembro de 2023 disse à Amnistia Internacional que alguns reféns relataram ter sido espancados, forçados a testemunhar ou participar em atos violentos, confinados em isolamento ou escuridão total e privados de necessidades básicas, o que levou a consequências graves e duradouras para a saúde mental e física. O profissional médico também disse que alguns reféns libertados relataram ter sido vítimas de violência sexual, incluindo nudez forçada e agressão sexual.
A Comissão Internacional Independente de Inquérito sobre os Territórios Palestinianos Ocupados, incluindo Jerusalém Oriental, e Israel (Comissão de Inquérito da ONU) afirmou, em setembro de 2024, que “recebeu informações credíveis sobre alguns reféns que foram vítimas de violência sexual e baseada no género enquanto estavam em cativeiro”, incluindo uma refém que relatou ter sido violada.
O Gabinete do Representante Especial do Secretário-Geral da ONU para a Violência Sexual em Conflitos e o Gabinete do Procurador do Tribunal Penal Internacional também relataram terem encontrado evidências de violência sexual, incluindo violação, contra reféns. A Câmara de Pré-Julgamento do TPI, ao aprovar o pedido do Procurador para o mandado de prisão contra Mohammed Diab Ibrahim Al-Masri (conhecido como Mohammed Deif), comandante da ala militar do Hamas, observou que “enquanto estavam em cativeiro em Gaza, alguns reféns, predominantemente mulheres, foram vítimas de violência sexual e de género, incluindo penetração forçada, nudez forçada e tratamento humilhante e degradante”.
O Hamas e a Jihad Islâmica Palestiniana submeteram todos os reféns que mantiveram em cativeiro, bem como os seus familiares, a abusos psicológicos. Mantiveram todos os reféns incomunicáveis, sem contacto com o mundo exterior. Negaram a todos os reféns a comunicação com as suas famílias e o acesso ao CICV até à sua libertação. Não forneceram uma lista dos reféns que mantinham, nem partilharam detalhes e atualizações sobre o paradeiro ou a condição dos reféns, negando assim às famílias informações sobre os seus entes queridos. Os familiares dos reféns com quem a Amnistia Internacional falou descreveram não ter recebido sinais de vida durante meses ou mais, bem como a dor e a angústia insuportáveis de não saber onde ou como estão os seus entes queridos, ou se e quando regressarão.
Grupos armados palestinianos separaram intencionalmente os familiares mantidos como reféns uns dos outros e mantiveram algumas crianças completamente sozinhas, de acordo com testemunhos prestados por reféns libertados a profissionais médicos. Erez Calderon, com onze anos na altura do seu rapto em Nir Oz, e cuja captura foi gravada num vídeo verificado pela Amnistia Internacional, disse à comunicação social israelita que foi mantido separado do pai e da irmã. Isto foi confirmado por familiares de Erez em reportagens separadas da comunicação social.
O Hamas e os grupos armados palestinianos publicaram fotografias e vídeos de reféns frequentemente feridos, em dor, medo ou implorando pelas suas vidas ou libertação. Também exibiram publicamente reféns diante de multidões durante o sequestro e em humilhantes “cerimónias de libertação”. Submeter reféns a tratamento tão humilhante e degradante é uma forma de violação da dignidade pessoal, o que é proibido pelo direito internacional humanitário e constitui um crime de guerra.
O Hamas e os grupos armados palestinianos publicaram fotografias e vídeos de reféns frequentemente feridos, em dor, medo ou implorando pelas suas vidas ou libertação. Também exibiram publicamente reféns diante de multidões durante o sequestro e em humilhantes “cerimónias de libertação”.
No final de julho e início de agosto de 2025, grupos armados palestinianos publicaram vídeos online de dois reféns que indicavam que estavam a ser sujeitos a maus-tratos graves. Um dos reféns, Rom Braslavski, é visto no chão de um túnel, emaciado e a chorar, num vídeo com o logótipo das Brigadas Al-Quds, o braço militar da Jihad Islâmica Palestiniana. Diz que está demasiado fraco para se levantar e que está à beira da morte.
Para aumentar o sofrimento da família, a Jihad Islâmica Palestina afirmou que, desde que o vídeo foi feito, perderam contacto com os sequestradores de Rom. Um vídeo de Evyatar David publicado a 2 de agosto de 2025 pelas Brigadas Al-Qassam mostra-o emaciado num túnel e a ser forçado a cavar o que diz acreditar ser a sua própria sepultura. Rom escreve em detalhe e com referência a um calendário anotado os dias consecutivos sem comida. Ser forçado a cavar a própria sepultura nessas circunstâncias também equivale a tortura, assim como a negação intencional de comida por longos períodos de cativeiro e abuso psicológico.
A retenção de reféns e a transmissão de vídeos de seu sofrimento não constitui apenas um crime contra as vítimas diretas. A incerteza e a angústia causadas aos entes queridos dos reféns constituem tortura ou outros maus-tratos.
Sequestro de reféns e apreensão de corpos
De acordo com uma base de dados produzida pelo jornal israelita Haaretz, cruzada com outros conjuntos de dados, das 251 pessoas sequestradas durante os ataques liderados pelo Hamas no sul de Israel, 27 eram soldados no ativo. A grande maioria das 224 pessoas restantes eram civis, incluindo 124 homens, 64 mulheres e 36 crianças. Entre os sequestrados em Israel, estavam 16 crianças com menos de dez anos e nove pessoas com mais de 80 anos. A maioria dos sequestrados eram judeus israelitas, incluindo alguns com dupla nacionalidade. Sete eram cidadãos beduínos de Israel. Pelo menos 35 eram estrangeiros. Em 36 casos, as vítimas já estavam mortas quando levadas para Gaza.
Com base em vídeos e depoimentos, a Amnistia Internacional documentou incidentes de indivíduos, casais e famílias que foram forçados a sair das suas casas em várias comunidades civis a 7 de outubro de 2023 e levados para Gaza, inclusive por membros das Brigadas Al-Qassam. Documentou também o sequestro de jovens do local do festival de música Nova e áreas circundantes, alguns dos quais foram forçados a sair dos abrigos antiaéreos onde se escondiam.
Shoshan Haran, fundadora e presidente da Fair Planet, uma ONG israelita de desenvolvimento, e membro da Women Wage Peace, um movimento popular pela paz, foi raptada com outros seis membros da sua família, incluindo três crianças, e mantida refém pelo Hamas. Shoshan, que vivia em Be’eri, um kibutz a cerca de quatro quilómetros da cerca que circunda Gaza, e tinha 67 anos na altura, disse à Amnistia Internacional que, após receber um aviso pelo WhatsApp, ela e a sua família se refugiaram na sua sala segura.
Shoshan disse à Amnistia Internacional que homens armados os forçaram a sair da sala segura. Um deles gritou em inglês: “Mulheres, crianças, levem. Homens, boom-boom”. Foram então levados para fora do kibutz, para Gaza. Quando ela e cinco membros da sua família foram libertados do que ela descreveu como “50 dias horríveis de cativeiro”, soube que o seu marido, Avshalom Haran, tinha sido morto depois de a família ter sido forçada a sair do seu abrigo. O seu genro, Tal Shoham, que tinha sido raptado com ela, passou mais de 500 dias em cativeiro antes de ser libertado.
“Homens armados forçaram-nos a sair da sala segura. Um deles gritou em inglês: ‘Mulheres, crianças, levem. Homens, boom-boom’”.
Shoshan Haran
A irmã de Shoshan, Lilach Kipnis, o marido da sua irmã, Eviatar Kipnis, e Paul Castelvi, um cidadão filipino que trabalhava como cuidador da família, também estavam entre os mortos no ataque ao kibutz.
Uma professora de 49 anos, Liat Atzili, descreveu à Amnistia Internacional ter sido feita refém em Nir Oz, outro kibutz perto da cerca que circunda Gaza. Disse que se escondeu na sua sala segura enquanto o kibutz era atacado e que, inicialmente, algumas pessoas vestidas à civil vieram, abriram a porta, pediram-lhe dinheiro e foram-se embora quando ela disse que não tinha nenhum.
No entanto, pouco depois, vieram homens armados. Liat reportou: “Duas pessoas chegaram, armadas, uniformizadas, e abriram a porta. Elas raptaram-me”. Disse que foi levada num veículo com outra pessoa do kibutz, mas foi separada dessa pessoa ao chegar a Gaza. Relatou à Amnistia Internacional que os guardas que a mantinham em cativeiro lhe disseram que eram membros do Hamas e contou que recebeu a visita de outros membros do Hamas durante o seu tempo em cativeiro. Entendeu que esses outros membros eram mais graduados a “fazer rondas entre os apartamentos” onde os reféns estavam detidos.
Além disso, entre as pessoas raptadas a 7 de outubro de 2023, estavam indivíduos claramente muito feridos, como se pode ver em vídeos verificados pela Amnistia Internacional. Entre eles estava Hersh Goldberg-Polin, de 22 anos, que foi raptado na estrada 232, perto do local do festival Nova, depois de ter fugido do ataque e procurado refúgio num abrigo antiaéreo.
A Amnistia Internacional também documentou provas de que combatentes palestinianos, provavelmente incluindo combatentes das Brigadas Al-Qassam e das Brigadas dos Mártires de Al-Aqsa, levaram para Gaza os corpos de pessoas que tinham sido mortas ou mortalmente feridas durante ataques no sul de Israel. Esta prática negou às famílias a oportunidade de enterrar os seus entes queridos e, em muitos casos, deixou-as sem saber, por vezes durante meses ou mais, se os seus entes queridos ainda estavam vivos ou tinham sido mortos.
Pelo menos 48 reféns que foram capturados vivos terão morrido em Gaza. Outros foram libertados em trocas negociadas ou resgatados em incursões militares israelitas, uma das quais resultou na morte de centenas de palestinianos.
Morte de reféns
As Brigadas Al-Qassam, ala militar do Hamas, e as Brigadas Al-Quds, ala militar da Jihad Islâmica Palestiniana, emitiram declarações públicas ameaçando matar os reféns israelitas que mantêm em cativeiro, em retaliação às ações israelitas, ou para impedir operações de resgate pelas forças armadas de Israel.
A 1 de setembro de 2024, as forças armadas israelitas anunciaram que, no dia anterior, haviam recuperado os corpos de seis reféns israelitas de um túnel subterrâneo em Rafah, perto de onde as suas forças haviam encontrado outro refém, Qaid Farhan Alkadi, de 52 anos, sozinho, mas vivo, num túnel, em agosto de 2024.
Três declarações publicadas por Abu Obaida, porta-voz das Brigadas Al-Qassam, nas redes sociais, a 2 de setembro de 2024, aparentemente em resposta ao anúncio das forças armadas israelitas, sugeriram que os seis foram mortos para impedir o seu resgate.
Em 2025, as Brigadas Al-Qassam intensificaram as ameaças de matar os reféns israelitas restantes. A 15 de fevereiro de 2025, conforme mostrado num vídeo analisado pela Amnistia Internacional, forçaram um dos três reféns israelitas que estavam a ser libertados numa troca negociada, a segurar uma ampulheta sobre uma fotografia de Matan Zangauker, um dos reféns ainda mantidos em Gaza, numa mensagem ameaçadora de que o tempo estava a acabar para os reféns restantes. A 24 de março de 2025, as Brigadas Al-Qassam divulgaram mais um vídeo mostrando dois reféns a implorar por um acordo de troca de reféns por prisioneiros, como a sua única hipótese de sobrevivência.
A 15 de fevereiro de 2025, conforme mostrado num vídeo analisado pela Amnistia Internacional, forçaram um dos três reféns israelitas que estavam a ser libertados numa troca negociada, a segurar uma ampulheta sobre uma fotografia de Matan Zangauker, um dos reféns ainda mantidos em Gaza, numa mensagem ameaçadora de que o tempo estava a acabar para os reféns restantes.
Os corpos de três dos reféns mais conhecidos sequestrados a 7 de outubro de 2023, a argentino-israelita Shiri Bibas e os seus dois filhos – Kfir Bibas, de nove meses, e Ariel Bibas, de quatro anos – foram finalmente devolvidos à família a 21 de fevereiro de 2025, como parte de uma troca negociada de reféns por prisioneiros. Três semanas antes, as Brigadas Al-Qassam libertaram Yarden Bibas, marido de Shiri e pai das crianças, que estava detido separadamente da sua esposa e filhos.
Shiri e os seus dois filhos estavam vivos e ilesos quando foram vistos a serem raptados de Nir Oz, a 7 de outubro de 2023, mas, num vídeo datado de 20 de dezembro de 2024, um porta-voz das Brigadas Mujahideen, o braço militar do Movimento Mujahideen Palestiniano, afirmou numa entrevista à imprensa que tinham sido mortos num ataque aéreo israelita, juntamente com os seus captores. As Brigadas Al-Qassam fizeram uma declaração no mesmo sentido, e o exército israelita disse que iria investigar a alegação. Nem as Brigadas Mujahideen nem as Brigadas Al-Qassam forneceram qualquer prova que substanciasse as suas alegações. As autoridades israelitas alegaram que as vítimas tinham sido mortas pelos seus captores, mas também não forneceram qualquer prova.
Alguns reféns foram mortos pelas forças armadas israelitas. Os casos mais conhecidos são os de Yotam Haim, de 28 anos, Samer Talalka, de 22 anos, e Alon Shamriz, de 26 anos, todos mortos a tiros a 15 de dezembro de 2023 no bairro de Shuja’iya, na cidade de Gaza, onde as forças israelitas enfrentavam resistência significativa de grupos armados palestinianos locais. As forças armadas israelitas assumiram prontamente a responsabilidade por essas mortes, enquanto no caso de outros três reféns – Nik Beizer, Ron Sherman e Elia Toledano –, o exército levou dez meses a anunciar que haviam sido mortos num ataque aéreo em novembro de 2023.
Contexto
Durante os ataques de 7 de outubro de 2023, no sul de Israel, cerca de 1.200 pessoas foram mortas. Mais de 800 eram civis, incluindo, pelo menos, 36 crianças. As vítimas eram principalmente judeus israelitas, mas também incluíam cidadãos beduínos de Israel e dezenas de trabalhadores migrantes estrangeiros, estudantes e requerentes de asilo. Mais de 4.000 pessoas ficaram feridas e centenas de casas e estruturas civis foram destruídas ou ficaram inabitáveis. A Amnistia Internacional concluiu que os grupos armados palestinianos cometeram violações do direito internacional humanitário e crimes de guerra durante os ataques e continuam a cometer crimes ao abrigo do direito internacional, com a detenção e maus-tratos de reféns e a retenção de corpos apreendidos.
Em maio de 2024, o Gabinete do Procurador do Tribunal Penal Internacional apresentou pedidos de mandados de detenção contra os líderes do Hamas Ismail Haniyeh, Mohammed Deif e Yahya Sinwar pela sua alegada responsabilidade pelos seguintes crimes de guerra e/ou crimes contra a humanidade, cometidos a partir de 7 de outubro de 2023: extermínio, homicídio, violação e outros atos de violência sexual, tomada de reféns, tortura, outros atos desumanos, tratamento cruel e atentados contra a dignidade pessoal. Em novembro de 2024, a Câmara de Pré-Julgamento do Tribunal emitiu um mandado de prisão contra Mohammed Deif. A câmara encerrou os processos contra cada um dos três suspeitos palestinianos após ter sido confirmado que tinham sido mortos em operações militares israelitas.
A ofensiva militar lançada por Israel na sequência dos ataques de 7 de outubro de 2023 matou mais de 65.000 pessoas, incluindo mais de 18.000 crianças, e feriu mais de 200.000, de acordo com o Ministério da Saúde com sede em Gaza. Muitas pessoas foram mortas ou feridas em ataques diretos a civis ou ataques indiscriminados, que, muitas vezes, exterminaram famílias multigeracionais inteiras. Dezenas de milhares de palestinianos em Gaza continuam desaparecidos; acredita-se que os seus corpos estejam presos sob os escombros de edifícios destruídos ou em áreas inacessíveis devido às operações militares israelitas. De acordo com o Gabinete das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA), 78% de todas as estruturas em Gaza foram destruídas ou danificadas, como resultado das operações militares israelitas.
Em novembro de 2024, a Câmara de Pré-Julgamento do Tribunal Penal Internacional emitiu mandados de prisão contra o primeiro-ministro israelita Benjamin Netanyahu e o ministro da Defesa israelita Yoav Gallant por crimes de guerra de fome de civis e de dirigir intencionalmente um ataque contra a população civil, bem como por crimes contra a humanidade de homicídio, perseguição e outros atos desumanos.
Em dezembro de 2024, a Amnistia Internacional concluiu que Israel está a cometer genocídio contra os palestinianos em Gaza através de assassinatos, causando graves danos físicos ou mentais e infligindo deliberadamente aos palestinianos em Gaza condições de vida calculadas para provocar a sua destruição física. Milhares de palestinianos de Gaza, na sua maioria civis, foram detidos durante as operações militares de Israel, muitos deles sujeitos a nudez forçada em público e tortura antes de serem transferidos para campos de detenção e prisões dentro de Israel.
Enquanto estavam detidos, as autoridades israelitas submeteram-nos sistematicamente a tortura ou outros maus-tratos, incluindo fome, violência física e sexual, e negaram-lhes acesso a observadores independentes e organizações humanitárias. Desde 7 de outubro de 2023, pelo menos 76 palestinianos morreram enquanto estavam sob custódia israelita, de acordo com a comissão de detidos palestinianos. Acredita-se que o número real de mortes de palestinianos sob custódia seja maior.
Os ataques de 7 de outubro de 2023 ocorreram num contexto de ocupação prolongada dos Territórios Palestinianos Ocupados por Israel e de violações generalizadas dos direitos humanos perpetradas pelas forças israelitas contra os palestinianos, incluindo a imposição de um sistema de apartheid e o bloqueio ilegal de longa data da Faixa de Gaza desde 2007.