A armadilha do curto prazo

A avaliação de empresas é um dos temas centrais das finanças modernas, mas também um dos mais desafiantes. Para Tim Koller, autor do livro “Valuation” e sócio da McKinsey, a essência do tema não mudou ao longo das últimas décadas e continua a centrar-se na capacidade de analisar objetivamente os fundamentos económicos de um negócio e projetar a sua criação de valor a longo prazo. O que se altera é o contexto: os ciclos económicos, as pressões de mercado e as expectativas dos investidores.

Warren Buffett, que se prepara para deixar a liderança da Berkshire Hathaway em 2025, tornou-se no exemplo de um investidor que olha para além das modas e da volatilidade do mercado acionista. O segredo está no essencial: privilegiar empresas com capacidade para gerar fluxos de caixa de forma sustentável. E o tempo tem provado que este princípio é duradouro. Durante a bolha das dotcom, em 2000, muitos acreditaram que as regras clássicas deixavam de se aplicar. O resultado foi o colapso de inúmeras empresas que confundiram crescimento em escala com criação de valor. O mesmo aconteceu em 2008 com a crise financeira internacional, em que os princípios básicos das finanças empresariais foram esquecidos por bancos e agências de rating. Hoje, perante empresas com capitalizações bolsistas superiores a um bilião de dólares (por exemplo, a NVIDIA tem uma capitalização bolsista de cerca de 4,4 biliões de dólares), a questão continua a ser a mesma: terá a empresa ou o negócio capacidade para continuar a gerar fluxos de caixa no futuro que justifiquem este valor?

A investigação académica demonstra que a visão de longo prazo não é apenas uma virtude moral, mas uma estratégia comprovada. E, ainda, que empresas que resistem à tentação de cortar custos de forma agressiva para satisfazer o mercado no curto prazo, conseguem criar mais valor ao longo do tempo. Pelo contrário, aquelas que cedem a essa pressão acabam, mais cedo ou mais tarde, a perder competitividade, clientes e, inevitavelmente, valor para os acionistas e demais stakeholders.

Um dos equívocos mais persistentes em finanças é a ideia de que o mercado valoriza apenas resultados trimestrais. Tal perceção tem levado muitos executivos a tomar decisões estratégicas excessivamente orientadas para ganhos imediatos. Contudo, a maioria dos investidores em mercado acionista (fundos de investimento, investidores institucionais e individuais com visão de longo prazo), representando cerca 75% do mercado, não têm uma visão de curto prazo. O ruído no mercado surge, deste modo, de minorias ativas, mas não são estas que, de forma consistente, determinam o valor de mercado das empresas. Assim, gestores que mantêm o foco no crescimento de longo prazo, em inovação e qualidade de produtos e serviços encontram mais resiliência, mesmo em tempos de crise.

A conjuntura atual acrescenta novos desafios à avaliação de empresas. Questões como a sustentabilidade, o endividamento público crescente ou as tensões geopolíticas pesam sobre os modelos financeiros. Ainda assim, importa lembrar que os líderes devem olhar para a natureza específica do impacto de cada um destes desafios: nem todas as empresas enfrentam os mesmos riscos, e muitas vezes o problema não é a incerteza em si, mas a incapacidade de comunicar de forma clara aos investidores como cada risco afeta o negócio.

Outro ponto crítico é a qualidade da decisão. As empresas não falham tanto pela falta de análise, mas porque deixam que enviesamentos cognitivos ditem escolhas. Por exemplo, a aversão à perda leva muitos gestores a descartarem investimentos que poderiam ser transformadores, isto porque dão um maior peso nas suas decisões às perdas face aos ganhos potenciais. Ou seja, tendem a colocar de parte projetos mais arriscados, apesar de terem um potencial maior de criação de valor para a empresa. Uma técnica que pode ser utilizada pelos gestores, para mitigarem este risco, é olharem para um novo investimento como parte de uma carteira de projetos de investimento que a empresa detém: o risco global, por efeito de diversificação, é muito inferior ao risco de cada um dos projetos isolados.

Avaliar empresas é, no fundo, questionar pressupostos, testar cenários e resistir à tentação de seguir o rebanho, nomeadamente em contextos de maior volatilidade. Num mundo onde o ruído de curto prazo é constante, a verdadeira disciplina financeira está em manter o foco na capacidade de geração de valor financeiro de forma sustentável a médio e longo prazos.