
A imagem mostra o símbolo da República Portuguesa no cabeçalho, onde está o nome do agrupamento de escolas e uma listagem com os nomes completos de uma turma de 1.º ano. Foi partilhada no grupo do Facebook André Ventura Portugal com a legenda: “17 crianças de etnia cigana e três miúdos que frequentaram a pré… nunca vi algo parecido”. Entretanto, a publicação foi apagada, mas até isso acontecer ficaram expostas as identidades de várias crianças, reconhecíveis pelos apelidos que as ligam a algumas famílias conhecidas da comunidade cigana de Moura.
“Fizemos uma participação à Inspeção-Geral de Educação e à Comissão Nacional de Proteção de Dados”, diz à VISÃO Bruno Gonçalves da Associação Cigana Letras Nómadas.
Para Bruno Gonçalves, esta é uma situação extremamente grave, que põe em risco as crianças expostas e que faz parte de uma estratégia que tem vindo a ser usada pelo Chega e pelos seus apoiantes para usar nomes de menores inscritos em escolas públicas como forma de os tornar um alvo para os que acreditam que a sua presença exclui a de outros portugueses.
“Isto está a tornar-se normal”, ataca o dirigente cigano, que diz que a Associação que dirige vai apresentar queixa às autoridades sempre que se depare com este tipo de exposição de menores. “Nós fizemos a nossa parte. Usamos os instrumentos que estão ao nosso alcance. Agora, resta-nos esperar que as autoridades façam também a sua parte”, afirma.
Moura, no Alentejo, é a casa de uma importante comunidade cigana e é também palco de tensões entre essa comunidade e a restante população. De resto, essas tensões têm sido apontadas como uma das razões para o sucesso eleitoral do partido de André Ventura nesse concelho alentejano.
Segundo Bruno Gonçalves, o apelido das crianças que aparecem na listagem é suficientemente conhecido em Moura para que haja muita gente que perceba imediatamente que se tratam de menores ciganos, mesmo que todos os nomes sejam portugueses.
De resto, Gonçalves diz que, embora involuntariamente, esta partilha no grupo de apoio a André Ventura acaba por expor uma outra forma de discriminação ao deixar claro que há uma turma quase exclusivamente constituída por alunos de etnia cigana. “Não era com certeza a intenção, mas mostra que pode haver ali outro tipo de discriminação”, sustenta, preocupado com o que diz ser um recrudescimento do ódio e da discriminação contra a comunidade a que pertence.
No início de agosto, a Comissão Nacional de Proteção de Dados anunciou ter aberto um inquérito a André Ventura e Rita Matias, precisamente por exporem os dados de menores. Ventura leu no plenário da Assembleia da República uma lista que Matias também divulgou nas redes sociais com nomes de crianças estrangeiras a frequentar uma escola pública, no início de julho.